Entre Oportunidade e Colapso: Construindo um Futuro Inclusivo e Responsável com a IA
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IBGC Horizontes
São Paulo - Brasil – Março 2025
Em 2017, muito antes de a inteligência artificial ocupar o topo das prioridades estratégicas das organizações, Marc Benioff, CEO da Salesforce, tomou uma decisão visionária: convidou um novo "executivo" para suas reuniões semanais de diretoria - uma inteligência artificial chamada Einstein Guidance.
Durante essas reuniões estratégicas com 20 a 30 executivos de alto escalão, Benioff literalmente se voltava para Einstein e perguntava: "OK, Einstein, você ouviu tudo isso, agora o que acha?"
O sistema oferecia análises imparciais sobre previsões do trimestre, apontava áreas fortes e fracas e, em algumas ocasiões, até mesmo destacava executivos que necessitavam de atenção especial. "Para um CEO, normalmente você tem vários políticos e burocratas na reunião dizendo o que querem que você acredite. O Einstein chega sem viés. Por ser baseado apenas em dados, é uma ferramenta transformadora", declarou Benioff na época.
Esse exemplo e muitos outros levantam uma questão fundamental: como a IA está redefinindo o processo decisório na governança corporativa e qual é o equilíbrio ideal entre a automação e o julgamento humano?
E este cenário não se limita ao mundo corporativo.
Vivemos um dilema global: como equilibrar o potencial transformador da Inteligência Artificial com a necessidade de preservar a autonomia humana, garantir responsabilidade nas decisões e manter a equidade social em um mundo cada vez mais automatizado?
A revolução da IA está reconfigurando nossa realidade. De um lado, avanços extraordinários: sistemas capazes de analisar volumes imensos de dados, algoritmos que antecipam tendências de mercado e assistentes virtuais otimizando operações complexas em tempo real.
Por outro lado, enfrentamos desafios críticos: questões éticas sobre a delegação de decisões, o risco de viés do algoritmo e o impacto na força de trabalho.
O momento atual exige uma reflexão profunda sobre como queremos moldar nosso futuro com a IA. Não podemos cair na armadilha do determinismo tecnológico, acreditando que o avanço da IA seguirá um caminho predeterminado e inevitável. Pelo contrário, temos a responsabilidade e a oportunidade de direcioná-la para servir ao bem comum.
A grande pergunta é: estamos preparados?
- Um estudo da Deloitte, realizado em outubro de 2024, revelou dados preocupantes sobre a relação entre conselhos e IA:
- 45% dos conselhos de administração ainda não discutem IA em suas agendas.
- 79% dos entrevistados afirmam que seus conselhos possuem conhecimento limitado, mínimo ou inexistente sobre IA.
- Apenas 2% dos respondentes consideram seus conselhos altamente capacitados e experientes no assunto.
- 46% estão insatisfeitos ou preocupados com o tempo que os conselhos dedicam à IA.
Se quisermos construir um futuro verdadeiramente inclusivo e responsável com a IA, precisamos de uma abordagem clara e estruturada.
Primeiro, é fundamental desenvolver frameworks de governança que estabeleçam limites claros para o uso da IA na tomada de decisão. Precisamos definir quando a IA deve atuar como suporte e quando a decisão final deve ser exclusivamente humana.
Segundo, devemos capacitar nossos líderes para interagir de forma eficaz com sistemas de IA. Isso exige novas competências que combinem conhecimento tecnológico com habilidades humanas essenciais: julgamento ético, inteligência emocional e pensamento estratégico.
Terceiro, é essencial que a IA não amplie desigualdades. A diversidade de perspetivas humanas precisa ser preservada e valorizada nas decisões organizacionais.
Por fim, a tecnologia deve potencializar, não substituir, a capacidade humana. A IA deve ser um suporte para decisões, não um substituto para o julgamento humano em questões que envolvem valores, ética e impacto social.
Um bom exemplo de boas práticas é o Itaú Unibanco, que tem demonstrado um compromisso sólido com a integração responsável da Inteligência Artificial (IA) em suas operações, alinhando-se às ações propostas para um futuro inclusivo e ético no uso dessa tecnologia.
O banco estabeleceu uma governança centralizada para suas plataformas de IA, garantindo uma adoção segura e escalável. Essa abordagem assegura que as soluções de IA sejam implementadas com responsabilidade, mantendo a supervisão humana em decisões críticas.
Além disso, o banco investiu significativamente na formação de seus funcionários em IA e análise de dados. Programas de treinamento foram desenvolvidos e abordaram desde estagiários até executivos de alto escalão, promovendo uma cultura organizacional que combina habilidades tecnológicas com competências humanas essenciais, como julgamento ético e pensamento estratégico.
O banco também reconheceu e reconhece a importância da diversidade de perspetivas na tomada de decisões e, por isso, mantém a diversidade como um diferencial competitivo e uma prioridade institucional. Isso garante que a implementação da IA não amplie desigualdades existentes, mas sim contribua para soluções mais inclusivas.
Exemplos como esse mostram que é possível adotar a IA de forma equilibrada e responsável. Mas ainda há muito a ser feito.
O futuro da IA nas organizações e na sociedade não está predeterminado. Estamos construindo esse futuro agora, por meio de nossas escolhas e ações.
Entre a oportunidade de criar organizações mais inovadoras e o risco de desvalorizar a contribuição humana, existe um caminho do meio. Esse caminho exige visão, coragem e compromisso com um desenvolvimento centrado no ser humano.
A questão não é se devemos ou não adotar a IA na governança, mas como integrá-la de forma que amplie, e não reduza, nossa capacidade de tomar decisões éticas e responsáveis.
O futuro que queremos - inclusivo, ético e centrado no ser humano - só será construído se agirmos com determinação hoje. E não pense que o que fizermos agora definirá o legado para as próximas gerações.
O que faremos agora redefinirá nossa realidade amanhã, ou melhor, nossa realidade hoje a tarde.
Referências
Generative Artificial Intelligence and Corporate Boards: Cautions and Considerations. Harvard Law School - https://corpgov.law.harvard.edu/2023/06/21/generative-artificial-intelligence-and-corporate-boards-cautions-and-considerations/
Governance of AI: A critical imperative for today’s boards - Delloite - https://www.deloitte.com/nz/en/services/consulting/analysis/governance-of-ai.html
How Marc Benioff Uses AI to End Politics at Salesforce Staff Meeting – Business Insider - https://www.businessinsider.com/benioff-uses-ai-to-end-politics-at-staff-meetings-2017-5
Do estagiário ao CEO: Itaú faz da IA o novo mantra para toda a empresa – Forbes Brasil - https://forbes.com.br/forbes-tech/2023/08/do-estagiario-ao-ceo-itau-faz-da-ia-o-novo-mantra-para-toda-a-empresa/
Liderança com Inovação: Estratégias para Manter sua Equipe na Vanguarda da IA – LinkedIn Learning - https://www.linkedin.com/learning/lideranca-com-inovacao-estrategias-para-manter-sua-equipe-na-vanguarda-da-ia/
Leia o artigo publicado em IBGC Horizontes
>https://www.ibgc.org.br/blog/lancamento-ibgc-horizontes-2025
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